quarta-feira, 8 de julho de 2015



A paisagem urbana de São Paulo está sempre em constante mudança. Esta transformação contínua deixa marcas na cidade que dificilmente são superadas, especialmente pela perda de construções de grande valor arquitetônico.
A bela imagem abaixo, do centro velho de São Paulo, é um exemplo bem prático disso:
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Se alguém observar esta foto na internet ou mesmo em um postal sem qualquer referência de onde esta rua está localizada, muito provavelmente a pessoa pode pensar que trata-se de uma foto de Paris, Viena ou qualquer cidade europeia. O espanto se dá quando constatamos que a imagem é da rua Líbero Badaró em 1920.
Dois destes prédios pertenceram ao Conde de Prates e foram construídos conjuntamente em 1911 o que deu a ambos, pelos paulistanos, o apelido de palacetes gêmeos. O projeto dos palacetes e a execução das obras ficaram a cargo dos engenheiros Samuel das Neves e seu filho Cristiano Stockler das Neves, este último o mesmo que projetou a Estação Sorocabana, atualmente Estação Júlio Prestes e Sala São Paulo.
Os palacetes em construção em 1911 (clique para ampliar)
Os palacetes em construção em 1911 (clique para ampliar)
Uma vez inaugurados, eles se transformaram em ponto de encontro e de trabalho da elite paulistana, como o próprio Conde Prates, Macedo Soares entre outros.
No prédio da esquerda (foto anterior) o local foi por muito tempo a Câmara Municipal de São Paulo e também a Prefeitura de São Paulo, que em 1951 mudou-se do edifício deixando a câmara ocupando o prédio inteiro. Nesta época o imóvel foi rebatizado como Palacete Anchieta.
Já o outro, mais próximo do Viaduto do Chá e da Praça do Patriarca, foi sede de um dos mais elegantes e famosos clubes da cidade, o Automóvel Club de São Paulo. Em 1921 o Palacete Prates recepcionou e hospedou o então presidente do Brasil, Epitácio Pessoa, que chegou em São Paulo com grande pompa e honrarias.
Vista do Vale do Anhangabau e Palacete Prates nos anos 1920
Vista do Vale do Anhangabau e Palacete Prates nos anos 1920
Toda elegância e importância de ambos os edifícios não foram suficientes para que fossem preservados. O grande boom do mercado imobiliário e da construção civil que atingiu São Paulo na segunda metade da década de 40 e por toda a década de 50, trataria de abreviar a vida dos palacetes.
Exatos 40 anos depois de ser erguido, o Palacete Prates (o mais próximo ao Viaduto do Chá) seria vendido e demolido, sendo o primeiro a sucumbir. Com a demolição já preparada para começar no final de 1951, começava a ser veiculada nos jornais paulistas o anúncio do que seria erguido no local:
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Sua demolição foi um demorada para os padrões atuais, e só foi concluída em meados de 1952. Sai de cena um marco do início do século 20 para dar lugar a então um dos mais modernos prédios da cidade, que seria batizado de Edifício Conde de Prates. A imagem abaixo, mostra a área do palacete em fase final de demolição.
Ao fundo, do outro lado do vale, o Theatro Municipal
Ao fundo, do outro lado do vale, o Theatro Municipal
Na época em que desapareceu o Palacete Prates até houve um certa debate acerca do fim do imóvel, mas ela foi muito branda e não foi suficiente para fazê-lo ser preservado. A discussão sobre o que era patrimônio histórico ou não em São Paulo ainda demoraria longos anos para ser posta em prática pra valer. Hoje em dia talvez fosse muito difícil demoli-lo.
O novíssimo Edifício Conde de Prates levaria cerca de quatro anos para ser construído. A conclusão das obras e inauguração do arranha-céu ocorreu em 1956.
Moderno e arrojado para o padrão daquela época sua abertura foi um grande evento na cidade, contando com festa de inauguração e benção feita por um padre. Na noite de 9 de julho, data de sua inauguração, o prédio permaneceu totalmente iluminado.
Recorte do jornal Folha da Manhã
Recorte do jornal Folha da Manhã
O segundo palacete ainda sobreviveria alguns anos mais, sendo desapropriado e demolido em 1959. Mas não sem fazer a Câmara Municipal de São Paulo, que depois de ter deixado o prédio entre 1936 e 1947 voltou ao imóvel, passasse um vexame.
divulgação
Os dois palacetes foram vendidos no mesmo ano, em 1951. Enquanto um deles foi rapidamente desocupado e demolido no mesmo ano o outro, que abrigava a câmara, foi palco de uma longa novela.
Adquiro pelo Banco Mercantil de São Paulo, o imóvel deveria ser desocupado pelo poder legislativo da cidade até o término do ano de 1952. Era tempo suficiente para procurar outro imóvel para se alojar.
Entretanto não parecia haver pressa nem mesmo preocupação por conta dos vereadores paulistanos e a novela foi se arrastando por anos, até 1958, quando o banco decidiu entrar na justiça pedindo o despejo da Câmara Municipal.
A ação foi julgada pela justiça e alvo de muitos recursos, até que em julho de 1959 saiu a vexatória sentença de despejo para a Câmara Municipal:
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Para evitar este episódio vergonhoso para a história da mais antiga instituição política de São Paulo, a câmara mudou-se para outro lugar rapidamente, enquanto iniciava os estudos para a construção de uma sede própria. O Palácio Anchieta, no Viaduto Jacareí, só seria inaugurado 10 anos mais tarde, em 1969.
Uma vez desocupado pelos vereadores o palacete foi rapidamente demolido, dando lugar para o Edifício Mercantil Finasa que está ali até hoje.
Quem observa atualmente a rua Líbero Badaró a partir do Viaduto do Chá, vê uma paisagem completamente diferente daquela vista pelos paulistanos um século atrás:
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Na foto acima estão, da esquerda para a direita, os edifícios Grande São Paulo, Mercantil Finasa e Conde de Prates. Entre estes dois últimos é possível observar o Edifício Sampaio Moreira, este que um dia foi o prédio mais alto de São Paulo. Quanta diferença!
Saiba mais:
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Eduardo da Silva Prates, o Conde de Prates, nasceu em 1860 na capital paulista. Foi um dos grandes vultos paulistas do final do século 19 e início do século 20.
Empresário voltado aos ramos financeiro, imobiliário e ferroviário, Prates herdou em 1893 a Fazenda Santa Gertrudes, uma das mais importantes produtoras de café no estado. O empresário viu-se neste momento como também um importante cafeicultor.
Sua residência, conhecida como Palacete do Conde Prates, ficava na Alameda dos Bambus (atual avenida Rio Branco) esquina com a alameda Ribeiro da Silba. Sua residência era grandiosa e estendia-se até a rua Guaianases, onde hoje é uma concessionária da Volkswagen. O Conde Prates faleceu em 1928.

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