quarta-feira, 8 de julho de 2015


Santapaula Iate Clube

Um marco da arquitetura brutalista paulista agoniza na Represa do Guarapiranga.
Iate Clube Santapaula (clique para ampliar)
Iate Clube Santapaula (clique para ampliar)
Muitas pessoas simplificam a imagem da cidade de São Paulo como a notável “Selva de Pedra”. Pouco verde, muito concreto, muita poluição, poucos pássaros. E os edifícios paulistanos tem um espaço especial na história do desenvolvimento da nossa cidade.
Da arquitetura colonial paulista passando pelas mãos de Bento de Oliveira Lima, o eclético de Ramos de Azevedo e os grandes prédios com fachada de vidro que hoje rasgam avenidas como a Eng. Luiz Carlos Berrini, expressam a história da cidade. Em cada prédio, um arquiteto e nisso São Paulo é o berço do Brasil.
Iate Clube Santapaula - Vista da fachada principal
Santapaula Iate Clube- Vista da fachada principal
E entre tantas formas arquitetônicas que São Paulo nos proporciona, tem uma em especial e peculiar: o Brutalismo Paulista.
Não precisa ficar assustado com esse nome, porque de brutal não tem nada. É a forma mais ampla e nítida que a arquitetura pode nos proporcionar. O Brutalismo coloca os elementos estruturais à vista da população. O concreto armado, vigas e pilares ficam a mostra, optando por deixar aparente e assim manifestando o rigor geométrico que a arquitetura possui.
O Brutalismo não nasceu em São Paulo. Foi uma tendência arquitetônica europeia que se popularizou nas décadas de 50 a 70 em forma de casas populares, fábricas e departamentos públicos.
Le Corbusier e o plano diretor para São Paulo que não foi concretizado.
Le Corbusier e o plano diretor para São Paulo que não foi concretizado.
Um dos mentores do Brutalismo foi o arquiteto e urbanista franco-suíço Le Corbusier que chegou a visitar as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro e elaborou planos diretores para essas urbes.
Esta tendência arquitetônica influenciou vários arquitetos brasileiros que residiam em São Paulo como Ruy Ohtake, Paulo Mendes da Rocha e João Batista Vilanova Artigas, este último, por sua vez, que em junho de 2015 estaria completando seu centenário de nascimento.
Nascido em Curitiba, Vilanova Artigas graduou-se pela Escola Politécnica (USP) e frequentou o Grupo Santa Helena. Autor de vários projetos importantes e de impacto sociológico, Artigas também foi criador da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU – USP). Inaugurado em 1969, o prédio é um dos melhores exemplos de arquitetura brutalista.
Detalhe da fachada da FAU/USP (clique para ampliar)
Detalhe da fachada da FAU/USP (clique para ampliar)
O impacto do brutalismo paulista é visível na sociedade, mas passa despercebido por várias pessoas. Exemplos não faltam tal como a Estação Armênia do Metrô projetada por Marcello Fragelli em 1968, o Centro Cultural São Paulo elaborado pelos arquitetos Eurico Prado Lopes e Luiz Telles em 1982 e o MASP por Lina Bo Bardi de 1968.
O que poucas pessoas sabem é que a primeira manifestação do brutalismo paulista ainda está de pé, a Garagem de Barcos do Clube Santa Paula, mais conhecido como o Santapaula Iate Clube (sim, santapaula escrito tudo junto).
Santapaula Iate Clube durante a construção (clique para ampliar)
Santapaula Iate Clube durante a construção (clique para ampliar)
Localizada às margens da represa do Guarapiranga, na avenida Atlântica, a Garagem de Barcos Santapaula foi projetada pelos arquitetos João Batista Vilanova Artigas e Carlos Cascaldi. Sua construção foi de 1961 a 1964.
O projeto original era para ser um conjunto de prédios de hotéis. A obra foi iniciada na década de 50, porém abandonada pelo antigo proprietário. Em 1961, Artigas e Cascaldi assumem a reforma do complexo e a construção do que viria a ser o marco na arquitetura brasileira, o Iate Clube Santa Paula.
Divulgação
Conhecido também como Iate Clube 61, este complexo mudou a face do então pacato bairro de Interlagos que estava sendo loteado e ganhando a atenção de empreendedores.
Adelino Borelli, presidente da Santapaula Melhoramentos uma empresa de administração, loteamento e imobiliária, viu a capacidade que Interlagos possuía e que poderia beneficiar o lazer dos paulistanos. A represa de Guarapiranga já era conhecida como a praia de São Paulo, porém sem nenhuma infraestrutura para as pessoas desfrutarem o dia por ali.
Folha de S.Paulo / Divulgação
Inaugurado em 1964, Santapaula Iate Clube logo se tornou ilustre. O complexo possuía amplas dependências sociais como piscinas, saunas, restaurante, postos de controle, embarcadouro e oficina para os iates, já que era o maior complexo de iate clube da América do Sul. Havia uma extensa estrutura para os associados poderem desfrutar o que a represa de Guarapiranga oferecia.
Um refúgio para quem não queria perder tempo em congestionamentos para o litoral, Santapaula virou opoint da moçada. Em 1973 o cantor Roberto Carlos chegou a se apresentar no Iate Clube arrastando milhares de pessoas.
Santapaula tinha tudo pra ser um sucesso, mas começou a entrar em decadência.  Em meados da década 80, o Iate Clube já não era mais o mesmo. Não sabemos efetivamente o motivo do fechamento, mas gradativamente o espaço foi encerrando as suas atividades.
Hoje o marco da arquitetura brutalista está abandonado. Maltratado pela ação do tempo, o antigo clube tem problemas de infiltração que estão em toda parte. As vigas de sustentação estão esfarelando. A ferrugem das estruturas faz parte do cotidiano, além de pichações por toda a parte.
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Mesmo com tantas dificuldades, o antigo Santapaula Iate Clube foi tombado em 2007 pelo Conpresp, ou seja, o recinto não pode ser demolido, mas com tantos problemas, é fácil afirmar que algumas partes do complexo correm certo risco de cair.
Em 2010, visando os turistas que viriam a São Paulo em virtude da Copa do Mundo FIFA 2014, foi aprovado pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico de São Paulo (Conpresp) o projeto de restauro do complexo.
O Santapaula Iate Clube seria inteiramente reformado para dar lugar a um complexo hoteleiro e centro de convenções.
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Passado quatro anos da aprovação pelo Conpresp e um ano da Copa do Mundo, nada foi feito por ali. O custo previsto apenas para a primeira fase do audacioso projeto seria de R$10 milhões. O proprietário do local é um grupo de empresas do ramo têxtil.
Que o futuro seja generoso com este marco do brutalismo paulista.
Ao fundo, a represa Guarapiranga (clique na foto para ampliar)
Ao fundo, a represa Guarapiranga (clique na foto para ampliar)
Vilanova Artigas
Vilanova Artigas
O CENTENÁRIO DE ARTIGAS
Se estivesse vivo João Batista Vilanova Artigas teria completado 100 anos em junho de 2015. Estão previstas várias comemorações como lançamento de documentário, livros e uma exposição sobre sua trajetória.
Artigas merece mais do que isso. Merece que suas obras sejam restauradas e respeitadas pela população e principalmente pelo poder público. O Iate Clube Santapaula está aguardando por este momento.
Esperamos que isto não demore a chegar.
Veja mais fotos do Santapaula Iate Clube (clique na foto para ampliar):
Foto: Glaucia Garcia de Carvalho
Foto: Glaucia Garcia de Carvalho
Foto: Glaucia Garcia de Carvalho
Foto: Glaucia Garcia de Carvalho
Foto: Glaucia Garcia de Carvalho

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